Glossário LITDIGBR

Cibercultura e
cultura digital

Luciana Salazar Salgado

A internet não é apenas uma hipermídia, mas um conjunto de tecnologias com dimensões políticas. Desenvolvida no Vale do Silício, combina a cultura libertária dos anos 1960 e a meritocrática dos anos 1990. Resultou em cibercultura, focada em controle e exclusividade, e cultura digital, voltada para compartilhamento e privacidade.

Diferenciados, esses termos apontam uma questão de fundo: não há apenas uma “internet”, nome dado à hipermídia abarcante de mídias nela reproduzíveis (rádio, TV, cinema…) ou emuláveis (jornal, livro impresso…), trata-se de um conjunto de tecnologias atravessado pela dimensão política de seus desenvolvimentos.

Nesse dispositivo, a técnica se apoia em dois pilares: protocolos estritos e metas de propagação; e a política que a atravessa está radicada na história do Vale do Silício, onde se deu a conjunção entre hippies (cultura libertária dos 1960) e yuppies (cultura prevalente nos 1990); uns interessados nas trocas sem intermediários, outros no ideal meritocrático. Com forte investimento estatal na pesquisa acadêmica e corporativa, aí se produziu:

  • A cibercultura, no cultivo de tecnologias que enfatizam seleção, segurança, rastreamento; herdeiras do princípio cibernético que pauta o estudo dos sistemas de controle. São emblemáticos os softwares proprietários cujas licenças supõem alheamento do usuário, assim como a demanda por login e senha para navegação: não há mar aberto, mas riozinhos meândricos. Cultura ligada à produção de patentes e serviços exclusivos, desemboca na plataformização, com suas decorrências individualizantes;
  • A cultura digital, no cultivo de tecnologias que enfatizam partilha, compatibilização, privacidade para cidadãos e transparência para Estados e corporações, ligadas à construção do comum. Reativada pelos hackers universitários dos 1980, com os softwares de código aberto, ambientes de compartilhamento e fóruns de usuários, evita alimentar a coleta indiscriminada de dados. Cultura ligada a espaços criativos desobrigados de aplicação imediata, supõe a disposição para aprendizados coletivos.

 

Essas culturas estão implicadas na dinâmica histórica, provocando transformações recíprocas; há hegemonias e resistências. Com base nisso, se pode entender, por exemplo, que a grande discussão sobre as IAs é, de fato, a respeito da cultura que as institui e treina.

COMO CITAR ESTE VERBETE:

SALGADO, Luciana Salazar. Cibercultura e Cultura Digital. In: CATRÓPA, Andréa; PEREIRA, Vinícius Carvalho; ROCHA, Rejane (Org.). Glossário LITDIGBR – Literatura Digital Brasileira. 2025. Disponível em: https://glossariolitdigbr.com.br/01-digitalidade/ Acesso em: dia/mês/ano.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FUNDAMENTAIS

Em setembro de 1995, os autores, membros do Hypermedia Research Centre na Universidade de Westminster, em Londres, publicaram este ensaio na Mute Magazine, revista inglesa que se propunha cobrir “cibercultura, práticas artísticas, net-art, autonomia e política radical”.

O livro disseca a ideia de “cultura” como cultivo de práticas que produzem valor. Procura situar, contextualizar, recuperar e debater uma espécie de mínimo múltiplo comum.

Pequeno ensaio que pretende responder sem niilismo à pergunta: “será que uma outra internet — mais próxima à que se vislumbrava nos anos 2000, descentralizada, menos vigilante, mais das pessoas do que de empresas e robôs — ainda é possível?”

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