A literatura digital argentina, apesar de global, se conecta com a identidade nacional. Destacam-se teóricos como Claudia Kozak, que introduz a ideia de “poéticas tecnológicas”, e autores como Ana María Uribe e Belen Gache, pioneiros no uso de meios digitais. A obra de Milton Läufer e Germán Ledesma também explora essa tradição.
A literatura digital, como o próprio nome indica, nasce digital, não nacional. Disso, podemos inferir que falar de literatura digital argentina parece, à primeira vista, um contrassenso. No entanto, como qualquer produção literária, esse tipo de literatura tem certas vinculações identitárias com aquilo que denominamos com o gentílico de “argentino”.
Quanto às contribuições teóricas provenientes da Argentina, destaca-se o livro Tecnopoéticas Argentinas. Archivo blando de arte y tecnología (2012). Nele, Claudia Kozak cunha um termo de interesse para os estudos de literatura digital na região latino-americana. Ela aponta que estamos diante de poéticas tecnológicas “quando as práticas artísticas e seus ‘programas’ assumem explicitamente o entorno tecnológico” (p. 197) e, com isso, ocorre uma problematização do fenômeno técnico. Na entrevista realizada em 2023, disponível no Youtube, Literatura Digital: Una mirada tecnosocial de la escritura, a mesma autora atualiza sua construção conceitual, acrescentando reflexões sobre as consequências da inteligência artificial e a necessidade de pensar criticamente as ferramentas digitais disponíveis a partir da literatura.
O livro El punto ciego. Antología de la Poesía Visual Argentina de 7000 a.C. al Tercer Milenio / The Blind Spot. Visual Poetry from Argentina, de Jorge Santiago Perednik, Fabio Doctorovich e Carlos Estévez (2016), reúne um trabalho exaustivo de coleta da vasta tradição da poesia visual que a argentina compartilha com outros países da região, especialmente com o Brasil. Uma destacada poeta visual argentina é Ana María Uribe, que começa fazendo trabalhos analógicos com foco nas tipografias. Depois, entre 1997 e 2003, ela desenvolve peças de literatura digital, adicionando uma cinética particular em Tipoemas y Anipoemas.
Por sua vez, Belen Gache, artista e intelectual argentino-espanhola radicada em Madri, reflete em sua prolífica produção ensaística sobre a literatura experimental, as materialidades das palavras, sua encarnação na voz que damos às máquinas, os dispositivos de leitura e escrita, bem como o diálogo entre cultura impressa e cultura digital. Sua obra artística abrange um amplo conjunto de temas e problemas que não estão necessariamente relacionados com uma identidade argentina, mas sim com uma perspectiva política localizada e crítica sobre o uso das tecnologias. Ela é considerada uma das poetas pioneiras no uso de meios digitais.
Em El Aleph a Dieta, uma obra do que seu autor, Milton Läufer, denomina literatura computacional, encontramos uma referência intertextual à tradição literária borgiana. Mas ele também recupera e ironiza sobre as disputas legais por plágio que ocorreram a partir de uma denúncia de María Kodama contra outro experimento literário, El Aleph engordado, de Pablo Katchajian (2009). Embora a obra de Katchajian não tenha suporte digital, ela constitui um elo dentro do que poderíamos chamar de literatura expandida.
Por último, em El susurro de los mercados: capitalismo financiero y literatura digital (2022), Germán Ledesma analisa um corpus próprio do que poderíamos chamar de literatura digital argentina, onde, além das peças de Ana María Uribe, Milton Läufer e Belén Gache, ele revisita obras de autores como Iván Marino, Gustavo Romano, Fabio Doctorovich, Gabriela Golde, Marina Zerbarini, Diego Alberti, entre outros.
COMO CITAR ESTE VERBETE:
GÓMEZ, Verónica Paula. Literatura Digital Argentina. In: CATRÓPA, Andrea; PEREIRA, Vinícius Carvalho; ROCHA, Rejane (orgs.). Glossário – LITDIGBR – Literatura Digital Brasileira. 2025. Disponível em: https://glossariolitdigbr.com.br/literatura-digital-argentina/ Acesso em: dia/mês/ano.
Entrevista realizada em 2020, como parte do projeto “Cartografia da Literatura Digital Latino-Americana”, do Laboratório Digital da Faculdade de Comunicação e Letras da Universidade Diego Portales. Trata-se de parte de uma série que aborda autores discutindo o impacto da descontinuação do Flash em 2020 sobre sua produção de literatura computacional.
Este livro é um glossário que reúne entradas de diferentes autores sobre as tecnopoéticas argentinas dos séculos XX e XXI, articulados em torno do conceito de “archibo blando”, isto é, um arquivo que precisa ser flexível e incompleto para dar conta das produções poéticas tecnológicas.
Entrevista com a pesquisadora argentina Claudia Kozak tematizando o conceito de literatura digital, exemplos de obras e autores e uma breve história do campo.
Livro sobre as relações entre o capitalismo financeiro e a literatura digital, abordando as fricções entre ambos os sistemas e a potência crítica dos experimentos digitais.
Partindo da metáfora do ponto cego como o lugar de onde não se pode ver, esta antologia lança luz sobre experimentos poéticos argentinos que até então permaneciam à margem dos sistemas hegemônicos. O livro reúne textos de 70 autores e os principais movimentos da poesia visual na Argentina ao longo do tempo.
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